Universitário ou raiz? Veja qual a diferença entre os subgêneros do sertanejo
Estilo musical coleciona diferentes vertentes ao longo de sua existência e popularidade
O Sertanejo foi o gênero musical mais ouvido no Brasil em 2023, segundo o Spotify. Com a cantora Ana Castela no topo das plataformas digitais, em outros anos, o gênero também se manteve em alta e tem passado por mais uma mudança como resultado de sua própria evolução.
A Boiadeira, por exemplo, se popularizou com o estilo musical conhecido como Agronejo, que faz referência ao universo do agronegócio e se revelou em hits como “Nosso Quadro”, “Dona de Mim” e “Pipoco”. Mas afinal, esse é um subgênero do Sertanejo?
Marcelo de Assis, pesquisador musical desde 1984 e jornalista, explicou sobre a evolução do gênero desde o Sertanejo Raiz e analisou o amadurecimento dos hits e das novas vertentes. “O sertanejo sempre foi um dos principais gêneros musicais na indústria brasileira. Desde seu início nos anos 1920, este gênero passou por diversas mudanças em seu estilo ao longo dos anos, justamente pela colaboração artística de seus protagonistas. A base raiz do gênero sempre foi um norte para tudo o que fosse desenvolvido após seu inicio, mas novos artistas surgiram e, com eles, novas propostas musicais foram implementadas no sertanejo”, começou ele.
De acordo com Marcelo, a popularidade do gênero se manteve devido a aproximação dos artistas com outros estilos musicais. “É notável, também, uma aproximação dos artistas sertanejos com outros gêneros, o que colaborou para aumentar sua popularidade. O sertanejo, que sempre foi uma música do interior do Brasil, passou a ganhar as capitais e, sucessivamente, os grandes centros do país”, continuou o pesquisador, afirmando que atualmente o gênero concorre diretamente com o pop e o trap.
As mudanças no estilo musical ligadas às narrativas de cada época também fizeram com que o gênero continuasse em alta dentre o público. À exemplo disso, temos o Sertanejo de Sofrência protagonizado por vozes femininas justamente em um momento em que as mulheres passaram a questionar a sociedade sobre suas limitações. Nesse cenário, surgiu um dos grandes sucessos do mercado musical brasileiros dos últimos tempos, Marília Mendonça. Com uma carreira meteórica, a cantora morreu em um acidente aéreo em novembro de 2021, mas continua inspirando outros nomes neste segmento.
“A música sertaneja sempre está no ouvido do público brasileiro e elas sempre fizeram parte do cotidiano do povo. Cada uma dessas vertentes acompanha a sociedade na forma de como cada um de seus artistas trabalham suas composições, com suas histórias. É uma questão de identificação. O público se identifica com cada refrão, cada frase que o artista exprime em suas canções. Esse é um tipo de relação que vai se adequando em cada época, tornando o sertanejo atual. É por isso que o gênero não sai de moda”, opinou Marcelo.
Embora os novos subgêneros sofram críticas dos amantes do Sertanejo Raiz e possam desagradar até mesmo artistas tradicionais, o pesquisador chamou de “maturidade” a tranformação pela qual os próprios cantores do meio passaram para se adequarem aos meios de difusão de seus sucessos e às novas parcerias com nomes que surgiram ao longo dos anos.
“Isso é uma forma de maturidade, pois o mercado musical, principalmente na era em que nos encontramos, do streaming, pede isso. Novos públicos foram surgindo e outros gêneros musicais se fortaleceram nos últimos anos. Para que o sertanejo, que é uma musica original do Brasil, não ficasse para trás, novas conexões musicais foram realizadas, artistas clássicos do gênero uniram suas vozes com novos artistas e quando isso acontece, você perpetua essa música para as novas gerações. Notamos que estes mesmos artistas, que fizeram grande sucesso nos anos 1980 e 1990, por exemplo, encararam esse desafio com naturalidade e isso é importante para que suas obras sejam apresentadas para as novas gerações”, concluiu o colunista de música e mercado no portal IG e membro do Grammy Latino..
Além do Sertanejo Raiz e Universitário, confira outras vertentes que surgiram ao longo da história do gênero:
Sertanejo Raiz
A linha do tempo do gênero começa com a versão original do Sertanejo, inspirada da música caipira e no cotidiano rural. Além das narrativas que envolvem a vida no campo, os cancioneiros também relatam os dramas familiares dos anos 1970 e 1980 e continuam a refletir na carreira de artistas atuais que tem a moda de viola como estímulo. Dentre os principais nomes do Sertanejo Raiz estão Tonico e Tinoco, Pardinho e Pardal, Tião Carreiro e Pardinho, Trio Parada Dura, João Mineiro e Marciano, Milionário e José Rico, Chitãozinho & Xororó, Roberta Miranda, Inezita Barroso e Pena Branca e Xavantinho.
Dentre as canções que mais marcaram a época estão “As Andorinhas”, do Trio Parada Dura, “Estrada da Vida”, de Milionário e José Rico, “Ainda Ontem Chorei de Saudade”, de João Mineiro e Marciano, “Rei do Gado”, de Tião Carreiro e Pardinho, “Majestade, O Sábia”, de Roberta Miranda e “Evidências”, de Chitãozinho & Xororó.
Sertanejo Romântico
O Sertanejo Romântico foi uma vertente que se consolidou na metade da década de 1990. Com histórias que remetiam a situações de casais como reencontros, desentendimento e separação, o subgênero foi representado principalmente pelas duplas Zezé Di Camargo e Luciano e Leandro e Leonardo, que focaram em composições deste cunho e dominavam nas rádios. Mais tarde, Paula Fernandes seria um dos principais nomes desta vertente.
Desta época surgiram músicas que se eternizaram na memória de uma geração inteira. À exemplo disso temos canções como “É o Amor” e “Me Leva Pra Casa”, de Zezé Di Camargo e Luciano, “Pense Em Mim” e “Desculpe Mas Eu Vou Chorar”, de Leandro e Leonardo. A vertente se mostrou viva anos depois com hits como “Pássaro de Fogo” e “Sem Você”, de Paula Fernandes.
Sertanejo Universitário
Nos anos 2000, o foco do gênero passou a ser a comunicação com um público mais jovem, celebrando letras que remetessemm a festas e romances da vida universitária. Além de um repertório mais simples, Marcelo de Assis opina que o teor das canções era apresentar “refrões fáceis de serem decorados, direcionado para um âmbito mais comercial”. É neste cenário que surgem João Bosco e Vinicius, Gusttavo Lima, Cristiano Araújo, Felipe Araújo, Michel Teló, Luan Santana e Gustavo Mioto.
“Balada”, de Gusttavo Lima, “Ai Se Eu Te Pego”, de Michel Teló, “Camaro Amarelo”, de Munhoz e Mariano, “Maus Bocados”, de Cristiano Araújo, “Meteoro”, de Luan Santana e “Chora, Me Liga”, de João Bosco e Vinicius, marcaram as paradas de sucesso em meados de 2010.
Sertanejo Pop
A evolução do Sertanejo acabou por fundir o gênero com o Pop, resultando em canções que se popularizaram nas rádios e plataformas de streaming. Artistas mais modernos testaram um estilo que até então não havia sido experimentado na indústria musical. “Isso intensificou ainda mais o trabalho de ‘featuring’ – designação em inglês que ganhou popularidade na indústria musical brasileira sob o nome de ‘feat’.”, explicou Marcelo de Assis.
Influenciados pelos próprios artistas do Sertanejo Universitário, o subgênero revelou hits como “Suíte 14”, de Henrique e Diego, “Te Assumi pro Brasil”, de Matheus e Kauan e “O Que Acontece Na Balada”, de Thaeme e Thiago. Hoje, a vertente é representada por um nome de peso: Ana Castela. Segundo o pesquisador, a cantora mostra um apelo ao sertanejo raiz, mas seus hits estão inseridos no Sertanejo Pop, sendo que o conteúdo de suas canções a remetem ao termo “Agronejo”, pelas referências ao estilo de vida ligada ao agronegócio.
Arrocha
Além das próprias vertentes do Sertanejo, um ritmo que tomou conta das rádios nos últimos anos no Brasil foi o Arrocha. Com influência de elementos do arrocha baiano, as canções também são voltadas a temas românticos e diversos são os representantes deste subgênero como, por exemplo, Tierry, Pablo, Tayrone, Thiago Brava e Nadson O Ferinha.
Embora tenha sido originado no início dos anos 2000, o estilo musical influenciado pela bachata se popularizou no país em canções como “Porque Homem Não Chora”, lançada por Pablo em 2015. Anos depois, Tierry dominaria as rádios e plataformas digitais com “Rita” e “Hackearam-me”.
Sofrência
Por fim, o estilo musical que se popularizou nas vozes femininas é um dos mais ouvidos nas plataformas de streaming desde o surgimento da “Rainha do Sertanejo”, que liderou o movimento conhecido como “Feminejo”. Revelado principalmente na potência da voz de Marília Mendonça, o ritmo descreve o sentimento de tristeza, melancolia e sofrimento amoroso, criando uma identificação com os ouvintes que possam ter passado por alguma quebra de expectativa ao longo de um romance.
Além da artista, que mesmo após sua morte continua liderando ranking com suas canções, Maiara & Maraísa, Naiara Azevedo, Paula Mattos e Lauana Prado também representam o subgênero. Dentre os principais hits da Sofrência estão “Infiel”, de Marília Mendonça, “50 Reais”, de Naiara Azevedo e “Medo Bobo”, de Maiara & Maraisa.
*Com informações de CNN