Surubão de Búzios: sexo na praia de nudismo é crime? Por que local isolado é procurado? Por que viraliza? Entenda
Fetiche, mas também a violência, podem ser motivados para busca por locais reclusos
Uma praia de difícil acesso, cercada por rochas e acessada somente por trilha. O cenário escondido, em Búzios, na Região dos Lagos, viralizou no último fim de semana, após imagens de um grupo de 15 pessoas fazendo sexo sobre as pedras ter ganhado as redes sociais. Depois do episódio, um debate sobre o tema surgiu: por que procurar o local para algo que poderia ser feito entre quatro paredes?
A Olho de Boi, apontada como o local em que tudo ocorreu, é uma praia de nudismo. Mas é importante ressaltar que, apesar disso, não é permitido transar por lá.
Não é difícil encontrar publicações de visitantes, que precisam se despir ao chegar ao local, conforme indicado por placas na trilha, de cerca de meia hora, como uma que informa “A partir deste ponto, a nudez é obrigatória”. Segundo informações da prefeitura de Búzios, a praia “pequena e encantadora” é usada por naturistas justamente pelo difícil acesso.
Mas, além dos cliques com o bumbum de fora ou a experiência de nadar pelado, o episódio recente mostra que há quem aproveite a ocasião para práticas sexuais. Advogado criminalista e professor de direito penal, Flávio Fernandes ressalta que praticar ato obsceno em público (até mesmo na praia de nudismo) é crime, conforme previsto no artigo 233 do Código Penal.
— As praias de nudismo são destinadas à prática do naturismo. De maneira alguma o naturismo deve ser confundido com orgia ou qualquer tipo de pornografia. O naturismo é uma prática regulamentada, com princípios éticos voltados à integração à natureza, incluindo a prática do nudismo sem cunho sexual — explica o advogado.
O site da Federação Brasileira de Naturismo (FBRN) frisa que a prática nada tem a ver com algo sexual. “Como no geral se apresenta a nudez ligada à sexualidade, em revistas, filmes, etc., as pessoas são levadas a associarem a prática naturista a práticas sexuais ou, simplesmente, erótico-exibicionistas”, diz a entidade, que completa: “Os Naturistas, certamente, não serão assexuados. Mas a sexualidade, qualquer que ela seja, não está presente na vivência Naturista coletiva. Ela fará, naturalmente, parte da vida íntima de cada um, como em geral em toda a sociedade.”
Na Praia do Abricó, em Grumari, na Zona Oeste do Rio, por exemplo, outra praia de nudismo no estado, visitantes relatam que placas informavam a quem chegava que a prática de naturismo não tinha conotação sexual.
Fetiche, repressão e modo de viver sexualidade
No último réveillon, por exemplo, uma cena parecida viralizou na Praia do Arpoador, na Zona Sul do Rio, quando a polícia abriu uma investigação para tentar identificar os participantes do que ficou conhecido como “surubão”. Desta vez, em Búzios, a Polícia Militar, por exemplo, intensificou o policiamento na região. O que os dois caso têm em comum, além de terem vídeos que viralizaram, é que só homens participavam do sexo grupal.
O psiquiatra Bruno Branquinho, que trabalha com enfoque na saúde mental da população LGBTQIAP+ e que também é cofundador do Núcleo de Medicina Afetiva (NuMA), uma clínica de São Paulo que propõe “atendimento sem preconceito”, ressalta ser necessário dissociar a ideia de que cenas como essas só seriam praticadas por pessoas LGBTQIAP+, para não correr o risco de estigmatizá-las.
A partir disso, uma das explicações que o médico aponta para explicar o comportamento sexual em um lugar público é o fetiche. Mas, no caso de Búzios, por exemplo, em que os homens buscaram uma praia escondida para o sexo grupal, a motivação pode ter ainda a influência de outros fatores.
— O histórico de marginalização e clandestinidade para relações de pessoas LGBTQIAP+ leva as pessoas a procurarem locais como esse — observa o psiquiatra.
O fato de manifestações amorosas como beijos e mãos dadas entre pessoas do mesmo sexo ser motivo de preconceito e até de violência motivariam ainda a busca por lugares escondidos (e vistos como mais seguros) para encontros. Já o sexo num local como esse, no entanto, mesmo que proibido, também poderia ter motivação na violência, que faz com que alguns não se sintam livres para viver a própria sexualidade.
— Em vez de ir a um motel ou à própria casa, vai a um lugar em que não conhece as pessoas, numa coisa causal, em que ninguém se conhece, para poder viver a própria sexualidade — completa Branquinho.
Já a psicóloga e sexóloga Tatiana Presser explica que cenas como essa viralizam por conta de o sexo ser ligado à moralidade na nossa sociedade. No entanto, ela entende que os praticantes de casos como os do Arpoador e o de Búzios não são pessoas que buscavam ali uma experiência nova.
— As pessoas que estavam ali, estariam em qualquer lugar. Poucas foram viver uma aventura (nova). Quem tem coragem de fazer uma suruba num lugar público, ainda mais no Arpoador, que é bem público, são pessoas que têm o costume de viver esse tipo de coisa — observa a psicóloga. — A maioria (dessas pessoas) lida com a sexualidade de forma livre e muito mais natural que o restante da sociedade, mas precisa esfregar isso na cara das pessoas, infringindo leis? Não. Consigo entender quem quer viver a sexualidade livremente, mas o mundo não está preparado para isso, ainda mais no Brasil.
*Com infromações de Extra