O café não te dá mais energia, mas te empresta — e o preço é pago em cansaço
Por todo o mundo, mais de 2 bilhões de xícaras de café são bebidas todos os dias, tanto para ajudar a acordar após uma noite de sono quanto para dar uma energia extra durante o dia. Essa ideia, na verdade, não está correta — cientistas apontam que o café nos empresta, temporariamente, uma sensação de maior disposição, afastando o cansaço. Esse preço é pago pelo corpo mais tarde, e o elemento central desse escambo é a cafeína.
A cafeína trabalha, em nosso cérebro, interagindo com a adenosina, um composto que age na regulação do ciclo de sono e vigília. Ela é a responsável por nos deixar cansados após a realização de atividades, já que seus níveis sobem durante o dia, liberada como subproduto da energia celular gasta. A adenosina se liga ao seu receptor, parte da célula que recebe sinais, que informa à célula que é hora de diminuir o ritmo, causando sonolência e sensação de cansaço.
Como age a cafeína
Quando dormimos, a energia gasta é menor, diminuindo também os níveis de adenosina, convertida em outros tipos de composto. Quando dormimos o suficiente, acordamos renovados, com as células prontas para outro dia de atividades. A cafeína ajuda com a sonolência porque ela se liga justamente aos receptores de adenosina, já que possui um formato similar, mas não idêntico — assim, não gera os sinais de cansaço que o composto cerebral gera. Ao ocupar o espaço, a cafeína impede a adenosina de se ligar, afastando o sono.
Notou que, nesse processo, não há energia extra gerada para o corpo? Isso quer dizer que, após acabar o período de ação da cafeína, que não se liga aos receptores para sempre, a adenosina que estava esperando para ocupar esse espaço volta à ação. Quando há muito do composto no aguardo, a sensação de cansaço pode voltar com força, às vezes de uma só vez. A conta da cafeína tem de ser paga, e a única moeda que o corpo aceita é o sono.
O horário em que você toma seu café também é importante, pois o impacto da cafeína irá depender da quantidade de adenosina livre que está no sistema, ou seja, que ainda não se ligou às células cerebrais. O café bebido mais tarde no dia, quando o sistema tem mais sinais de sonolência por aí, pode fazer seu organismo se sentir mais poderoso do que se você o bebeu mais cedo.
Mas se você beber muito tarde no dia, a cafeína pode acabar conferindo uma dificuldade extra na hora de dormir. A meia vida da substância — ou seja, o tempo necessário para quebrar metade dela — é de, aproximadamente, 5 horas, com variações dependendo de como cada corpo a metaboliza. Entusiastas mais frequentes do café podem sentir menos o efeito da bebida, já que a tolerância a ela aumenta com o tempo.
Outros fatores que emprestam energia
A cafeína também aumenta os níveis de cortisol no corpo, um hormônio do estresse que nos deixa mais alerta. Por isso, a substância é mais eficiente mais tarde na manhã, já que acordamos com níveis mais altos de cortisol naturalmente. Um café bebido logo que saímos da cama pode parecer não fazer tanto efeito por conta disso.
Caso a bebida também leve açúcar, tanto a sensação de alerta quanto a perda dela serão maiores, já que o doce cria energia bruta no corpo, mas os açúcares livres na bebida irão aumentar a glicose do sangue, gerando mais sensação de cansaço após sua queda mais adiante. Não há nenhum malefício apontado pela ciência para beber café de barriga vazia, mas caso você tenha se alimentado antes do consumo, a bebida pode afetar o organismo mais lentamente, já que a comida pode diminuir a taxa de absorção da cafeína.
Vale lembrar que outras bebidas também contém cafeína, como chás, energéticos, alguns refrigerantes e outros produtos. Como os ingredientes, em geral, vêm das plantas, cada bebida cafeinada terá seus próprios compostos, que podem dar efeitos estimulantes dos mais variados. A substância, no final das contas, não faz milagres — para adquirir e repor energia, o melhor é consumir alimentos e água o suficiente e dormir bem. O café pode ser uma muleta, mas nunca deve ser nossa fonte única de vigília.
Fonte: The Conversation