Deixa rolar
Quando alguma coisa desagradável nos atinge e ficamos impedidos de reação, aquelas bondosas pessoas ao nosso redor sugerem: “Deixa rolar!”. Entendo a sugestão de que “o que não tem solução, solucionado está”. E há razão plausível para a não-ação. Qual o sentido de reclamar ou tentar se debater diante de situações alheias ao nosso controle? Puro desgaste, desperdício de energia que deveria ser direcionada ao possível em prol do melhor.
O que não quer dizer, todavia, que se deva deixar dominar pela apatia diante de quaisquer adversidades. Ou que se deva entender que toda situação difícil ou complicada seja, necessariamente, inelutável. Na verdade, as coisas que incomodam, que parecem fortes, arredias ou antagonistas servem para nos fortalecer e buscar, com resiliência, vencer.
Terminaram no domingo passado as provas da paraolimpíada de Paris. Mais uma vez os brasileiros deram brilho ao espetáculo. Recorde de 89 medalhas, 25 de ouro, 26 de prata e 38 de bronze. Ficamos em 5º lugar geral. Nos jogos olímpicos, com enorme cobertura da mídia, com prêmios maiores e superexposição, conquistamos menos medalhas, apenas 20, do que as de ouro do paralímpico, 25. A cobertura, por um único canal, teve o grande mérito de convidar comentaristas PcD, que conheciam muito o paradesporto e deram um show de domínio do tema, o que valorizou grandemente as disputas.
As falas, cheias de brincadeiras e de “zoação”, mostraram que o excesso de zelo, de “mimimi”, em relação ao considerado “diferente” implica em exclusão, em quase banimento das oportunidades de interação social de PcD. Um jovem comunicador, também PcD, em um Stand Up, arrancava risos da plateia enquanto trazia muitas razões para reavaliar posturas. Ele dizia, do nosso grande medalhista nas piscinas, Gabriel Araújo, o Gabrielzinho, que conquistou 3 ouros (50 e 100 costas e 200 livres) uma coisa que pouca gente avalia. Como é que uma pessoa sem braços e sem pernas inicia nesse esporte? Quem o teria colocado, ou jogado, na piscina pela primeira vez? Outra questão levantada, como anedota, mas que tem um forte apelo emocional foi a observação de que na natação, a chegada é informada pelo toque da mão na beira da piscina…, mas o Gabrielzinho não tem braços. Então, supostamente, ele ganha a medalha e, ao mesmo tempo uma concussão ou uma fratura craniana, pois ele precisa bater a cabeça ao final da prova. E quanto à virada nas provas maiores que 50 metros? Nesse caso os impactos são múltiplos. É de se pensar. Mas também, da forma como é colocado, é bem engraçado.
Por isso, é imprescindível estimular crianças, com ou sem deficiência a participar de esportes, até para criar laços, responsabilidade, foco. Tudo isso se reflete nos sorrisos largos aliados a gratidão e felicidade incontidos. Como disseram os atletas, não é vencer o outro, é vencer a si mesmos, se perceberem melhores que antes. Como no belo samba interpretado pelo grande Zeca Pagodinho: “… o negócio é deixar rolar; sou feliz e agradeço por tudo o que Deus me deu!”.
Mário Sérgio Rodrigues Ananias é Escritor, Palestrante, Gestor Público e ativista da causa PcD. Autor do livro Sobre Viver com Pólio.
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14 Comments
Excelente texto e muito engraçado kkk. O comediante é OVini.Santos kkkk muito engraçado também.
Além de trazer a tona que a inclusão ela é feita de todas as formas e mostrar que o Gabrielzinho é um grande exemplo de superação e determinação como o autor desse texto.
Te amo pai.
Obrigado, meu filho.
Parabéns pelo belíssimo texto. Esporte sempre será um incentivo para o crescimento das crianças, principalmente, àquelas que possuem algum tipo de deficiência. Vencer a si mesmo é um dos maiores desafios.
Obrigado, Lúcia.
Um espetáculo! Assim devemos falar sobre o que os PcD’s fizeram nos jogos Olímpicos em Paris!
Um orgulho para o Brasil e uma inspiração para todos que em algum momento foram discriminados e se sentiram incapazes!
É importante ressaltar que a família tem um papel fundamental na vida das pessoas que as cercam, acredite que todos somos capazes de vencer!
Parabéns Mário Sérgio Rodrigues Ananias e obrigada por compartilhar este artigo!
Obrigado, Cristina.
“excesso de zelo causa exclusão”… perfeito! essa onda do “politicamente correto” é um saco. Penso que já passou da hora de voltarmos à velha e boa amizade pela amizade, ao sucesso pelo mérito e à honra pelo caráter. Há alguns dias uma certa figura famosa foi denunciada por um ato reprovável, e parte da imprensa relativizou a gravidade dos acontecimentos em razão de algumas peculiaridades da pessoa. Isso é absurdo… o certo é o certo, o errado é o errado, o êxito decorre do esforço, e a superação faz parte da sobrevivência da própria espécie humana. Parabéns aos pcds pela excelente participação… viva a vida!!!! uma ode para a liberdade!
Obrigado, Diógenes.
A cada dia temos que agradecer a Deus por tudo!!!
São situações que não podemos imaginar porque acontece, mas quando vejo um “pcd” fazendo e se dedicando a VIVER BEM realmente sei que Deus existe e nos fortalece sempre…
Meu querido Mário só tenho que agradecer por ter esse dom maravilhoso da escrita e ânimo que nos traz
Obrigado, Tadeu.
Impecável explanação! Obrigada! Parabéns!
Obrigado, Luiza.
A criança com PcD estimulada desde cedo a praticar esportes ou outra atividade qualquer, tem grandes possibilidades de desenvolver habilidades físicas, cognitivas e sociais de forma mais ampla. Além disso, a participação em atividades coletivas favorece a socialização, promovendo o bem-estar emocional e a inclusão. Quando estimulada desde cedo, a criança com deficiência pode superar desafios com maior facilidade, desenvolvendo autonomia e resiliência. Temos que respeitar e reconhecer os talentos e as potencialidades dessas pessoas.
Mario, tema muito bom para reflexão no dia a dia.
Obrigado Gélia.