Sob expectativa de premiar uma mulher, Nobel de Literatura reconhece obra de homem

O escritor tanzaniano Abdulrazak Gurnah foi laureado pela Academia Sueca, o que agradou a crítica pela excelência de seu trabalho, com uma perspectiva geográfica e racial. Porém, com 16 mulheres premiadas em 120 anos, especialistas e casas de apostas esperavam a nomeação de nomes como Chimamanda Ngozi Adichie, Margaret Atwood ou Annie Ernaux

O prêmio Nobel de Literatura foi concedido ao escritor tanzaniano Abdulrazak Gurnah por sua “intransigente e compassiva penetração nos efeitos do colonialismo e o destino dos refugiados no golfo entre culturas e continentes”, declarou a Academia Sueca na manhã desta quinta-feira (7). O romancista laureado é a quarta pessoa negra, e a segunda negra do continente africano, a ser premiada na categoria, que desde 1993 não reconhecia nenhum escritor afrodescendente. Dos laureados, 77.5% são europeus. Em 2020, a poetisa e ensaísta estadunidense Louise Glück foi a escolhida.

A escritora é uma das 16 mulheres que, em 120 anos de prêmio, tiveram seus conjuntos de obra premiados pela Academia no campo da literatura. A primeira foi a sueca Selma Ottilia Lovisa Lagerlöf, em 1909. Do grupo, apenas duas não eram estadunidenses ou europeias: a chilena Gabriela Mistral, que foi reconhecida em 1945, e a sul-africana Nadine Gordimer, em 1991. Por fim, somente uma foi negra, a estadunidense Toni Morrison, laureada em 1993.

Em 2018, o prêmio foi suspenso após uma denúncia de assédio sexual envolvendo 18 acadêmicas, mulheres de acadêmicos e suas filhas que declararam, ao jornal sueco Dagens Nyheter, que foram agredidas e estupradas por uma figura ligada à premiação, não revelada na época. Tempos depois, o membro da Academia Sueca Jean-Claude Arnault foi acusado por má-conduta sexual e por vazar informações privilegiadas. Jean-Claude foi sentenciado a dois anos por estupro.

Abdulrazak Gurnah (Foto: Reprodução Instagram)
O tanzaniano Abdulrazak Gurnah é o 4º negro a ganhar em 120 anos (Foto: Reprodução Instagram)

Para este ano, a expectativa era de que uma mulher fosse reconhecida pelo Nobel de Literatura. A crítica literária e as casas de apostas mundiais, que comumente abrem os palpites com base em nomes de destaque em cada uma das áreas premiadas, citaram mulheres em sua maioria. As apostas na britânica Ladbrokes se concentravam em dois nomes: a francesa Annie Ernaux, que tinha uma chance em oito de ganhar, empatada com o queniano Ngũgĩ wa Thiong’o. Com exceção de Ngũgĩ e do japonês Haruki Murakami, o topo da lista era feminino: Margaret Atwood, Lyudmila Ulitskaya, Anne Carson, Lyudmila Ulitskaya, Maryse Condé e Joyce Carol Oates, que também apareceram com relevância nos palpites de outras empresas. É importante destacar também a nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie e a estadunidense Joan Didion, bem cotadas pela crítica e apostas.

De acordo com publicação no Instagram do perfil internacional da ONU Mulheres, desde a criação do Nobel (considerando todas as categorias), “menos de 60 mulheres foram reconhecidas”. A organização declarou ainda que “isto precisa mudar” e instigou os seguidores: “Qual mulher você gostaria de ver ganhando o prêmio Nobel?”.

Contexto de premiações

Em um cenário no qual diversas premiações culturais revisitam seus históricos de reconhecimento, que comumente privilegiam artistas homens, o anúncio da Academia Sueca causou estranhamento na perspectiva de gênero, mas foi comemorado ao considerar o recorte geográfico e de raça. Neste ano, o Oscar, principal disputa do mercado estadunidense de cinema, incluiu duas mulheres, a chinesa Chloé Zhao e a britânica Emerald Fennell, na categoria de melhor direção – algo inédito em seus 93 anos -. Quem levou o prêmio foi a primeira, por seu trabalho em Nomadland, pelo qual a estadunidense Frances McDormand foi reconhecida como melhor atriz. No total, 78 indicações foram feitas para 72 competidoras. 

No Festival de Cannes, realizado em julho deste ano, a maioria do júri foi composto por mulheres; cinco dos nove nomes. A atriz e diretora francesa Mélanie Laurent, a atriz estadunidense Maggie Gyllenhaal, a cantora canadense Mylène Farmer e outras duas diretoras, a austríaca Jessica Hausner e a francesa Mati Diop, foram as responsáveis por designar os prêmios.

De acordo com Anders Olsson, membro do comitê da Academia Sueca, a organização pensa em medidas para incentivar a diversidade dos laureados no próximo ano. Em uma recente entrevista à revista The New Republic, Anders revelou que a Academia planeja ter especialistas em idiomas de locais nos quais o comitê não tem um “profundo conhecimento” – essencialmente em países da África e Ásia -, que vão ser responsáveis por elaborar relatórios com sugestões.

Confira a declaração da ONU Mulheres:

*Com informações da Glamour.

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