O que aconteceria com o planeta se os humanos desaparecessem de repente?
A história humana na Terra começou aproximadamente há 350 mil anos, mas a vida em nosso planeta é muito mais antiga — estima-se que os primeiros animais simples surgiram há 600 milhões de anos. Isso significa que o planeta pode existir muito bem sem nós. Mas o que aconteceria com os traços da nossa civilização se fôssemos extintos?
Essa é uma pergunta valiosa para alguns pesquisadores, porque as respostas podem nos ajudar a ter uma concepção melhor sobre nosso lar. Além disso, se o planeta seguir o curso natural, o desaparecimento da humanidade é algo inevitável, já que as espécies costumam ser extintas à medida que os ambientes mudam.
Isso foi verdade para as primeiras formas de vida do nosso planeta. Na época do grande evento de oxigenação, há 2,4 bilhões de anos, as cianobactérias começaram a produzir mais oxigênio como produto de seus processos biológicos, o que levou à extinção da maioria dos organismos anaeróbios. Além desse, houve outros cinco grandes eventos de extinção, como o dos dinossauros.
Organismos sempre competem por melhores lugares no meio ambiente, a fim de obterem melhores condições de reprodução. Isso, somado à mutação genética, leva ao surgimento de novas espécies com certas vantagens em relação às mais antigas. Não há muitos motivos para acreditarmos que conosco será diferente, principalmente porque somos nós os causadores da maior ameaça à nossa própria espécie.
Então, o que aconteceria com o mundo se desaparecêssemos em um sétimo grande evento de extinção? Uma vez que a vida sempre encontra meios de prosperar e sobrepujar as condições hostis, a primeira conclusão óbvia é que a natureza invadiria nossas cidades. Mas como exatamente isso aconteceria? Isso é o que o pesquisador, escritor e jornalista Alan Weisman tentou descobrir enquanto escrevia o livro “The World Without Us” (O mundo sem nós, 2007).
Wisman passou vários anos entrevistando especialistas e pesquisando essa questão, e descobriu que a natureza é muito boa em enterrar vestígios de civilizações. Por exemplo, muitas ruínas e restos de cidades como Tikal só foram descobertas sob florestas após escavação arqueológica. Pense nisso: metrópoles inteiras como São Paulo poderão um dia se esconder embaixo de florestas exóticas, repleta de espécies que, hoje, ainda nem sequer existem.
Assim como outras cidades antigas, Tikal tem uma grande vantagem — seus prédios e templos de pedra. Essas construções são muito mais resistentes ao tempo em comparação a nossos prédios com estruturas metálicas e de vidro. Sem manutenção humana, estes seriam um dos primeiros a desabar. “É incrivelmente emocionante a rapidez com que a natureza pode nos enterrar”, disse Weisman.
Mas bem antes disso acontecer, outros efeitos catastróficos atingiriam nossas cidades. Weisman descobriu que sem pessoas para operar bombas que desviam as chuvas e o aumento da água subterrânea, os metrôs de lugares como Londres e Nova York inundariam poucas horas após nossa extinção. Levaria cerca de 36 horas para os metrôs inundarem completamente, de acordo com o escritor.
Outra consequência quase imediata seria a falta de energia elétrica em todo o planeta, já que não haveria ninguém para alimentar usinas movidas a combustíveis fósseis. Geradores de energia eólica se desgastariam até deixarem de funcionar, enquanto as usinas nucleares entrariam em modo de segurança por acúmulo de energia sem ninguém para consumir.
Animais que hoje dividem espaços urbanos conosco, domesticados ou não, voltariam a viver sob a “lei da selva”, com a invasão de pragas e predadores que notarão nossa ausência. Cães e gatos, por exemplo, viveriam em situações mais precárias e entrariam em uma nova cadeia alimentar, esforçando-se para se adaptarem ao novo mundo, o que, talvez, levaria à evolução dessas espécies.
Falhas em refinarias de petróleo e usinas nucleares resultariam em incêndios massivos, explosões nucleares e radiação se espalhando por vários lugares. Isso poderia afetar a vida a curto prazo, mas não o suficiente para eliminá-la. Uma prova incontestável de que a natureza pode sobreviver a esses desastres é a cidade fantasma de Pripyat, norte da Ucrânia, onde ocorreu o acidente nuclear de Chernobyl. Embora a radiação seja fatal para nós, humanos, voltarmos a ocupar a região, a vida continua a prosperar por lá.
Muitos dos poluentes que descartamos na natureza podem levar milhões de anos para desaparecer, mas boa parte deles podem ser absorvidos por organismos. Resíduos de petróleo que se derramam ou se infiltram no solo seriam decompostos e reutilizados por micróbios e plantas, enquanto poluentes orgânicos persistentes seriam enterrados para garantir a segurança dos seres vivos. Gradualmente, a natureza se recuperaria de muitos males que causamos.
Na Terra, qualquer lugar que receba luz solar pode florescer. Isso inclui até mesmo as calçadas, ruas, estradas e pontes. Bastam algumas rachaduras e sementes espalhadas por pássaros para que ervas daninhas destruam concretos e árvores cresçam por toda a parte. Viadutos desabariam nas rodovias, pontes despencariam nos rios e, gradualmente nossas maiores conquistas de engenharia desapareceriam por completo.
Por outro lado, o acúmulo de matéria orgânica seca nas cidades, como folhas e galhos, alimentariam incêndios provocados por raios. “Os incêndios vão criar muito material carbonizado que cairá nas ruas, o que será ótimo para nutrir a vida biológica. As ruas se converterão em pequenos campos e florestas crescendo em 500 anos”, conta Weisman. Isso desencadearia um aumento da biodiversidade em escala global.
Mesmo que levasse milhões de anos para que o planeta se recuperasse das extinções causadas pelos humanos — conhecidas como extinção em massa do Holoceno —, um nível básico de riqueza de espécies e uma distribuição de animais de grande porte em todo o planeta se aproximaria de épocas pré-antropoceno. Isso levaria algo entre 3 e 7 milhões de anos.
Por fim, as mudanças climáticas também entram em jogo, o que torna tudo mais incerto, já que é difícil prever as consequências da emissão de dióxido de carbono. Embora ele não fique suspenso na atmosfera para sempre — graças à capacidade dos oceanos na absorção do gás —, há limites para quanto pode ser eliminado. Os níveis atuais de CO2 levarão milhares de anos para serem totalmente removidos da atmosfera.
Para Weisman, todos os anos de pesquisa para desenvolver esse trabalho servem para nos motivar a manter a esperança. Ele explica que, quando começou a falar sobre o meio ambiente, muitas pessoas se sentiam mal com os danos que causamos na Terra e preferiam não falar do assunto. “Eu descobri que uma maneira de me livrar do fator medo era matar primeiro [os humanos]”, disse ele.
Com essa estratégia, ele conseguiu levar pessoas a prestar atenção em nosso lar. “Eu queria que as pessoas vissem como a natureza poderia voltar e até mesmo curar muitas das cicatrizes que nós criamos neste planeta. Então, pensar, existe uma maneira de nos adicionarmos de volta a esta imagem de uma Terra restaurada?” A reflexão é mais que bem-vinda.
*Com informações do Canaltech.