A NOSSA CANASTRA


Assistindo ao programa Globo Repórter, onde foi apresentada a belíssima Serra da Canastra, no interior do Estado de Minas Gerais, me veio uma curiosa e feliz lembrança de nossas viajações pelo Brasil afora. Quando nos mudamos de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro, na década de 1940, a vovó Augusta, mãe da mamãe, ofereceu a ela uma canastra, para embalar roupas de cama e banho e pequenos objetos que ela havia recebido como presentes de casamento. Ia tudo misturado. Esta canastra nos acompanhou de BH ao Rio e de lá para o Rio Grande do Sul, São Paulo, e na volta para Belo Horizonte, onde ela interrompeu suas viagens, não por falta de uso, mas porque já estava um cacareco.
Quando o programa mostrou uma canastra, como a que deu origem ao nome da famosa serra, identifiquei-a com a nossa. Igualzinha. Lembro que era de madeira, a tampa coberta com um tecido grosso e listrado, que abria por cima, uma alça de cada lado; e trancada com cadeado. Para dar firmeza e ainda ajudar no seu transporte, era ainda amarrada com cordas e elásticos.
O papai, cientista pouco acostumado a carregar qualquer peso, a não ser o do próprio intelecto, nem passava perto dela; era a mamãe que a arrastava nas estações de trem por onde embarcávamos. Mas, preciso fazer uma ressalva em nome dele, porque ele sempre viajava na frente, antes de nós, para arranjar nossa moradia perto dos quartéis por onde serviu ou das universidades onde lecionou. Interessante que não havia carregadores naquela época e as bagagens, sem rodinhas evidentemente, eram sempre levadas pelos próprios passageiros. Assim, era a mamãe, sempre muito disposta e despachada, que arrastava a nossa pesada canastra, seguindo o marido sonhador.
Ocorre que, a partir do Rio de Janeiro, a mamãe arranjou uma ajudante das melhores, a Maria Vicentina. Cozinheira, arrumadeira e babá, ela nos acompanhou por muito tempo até se estabelecer, pelo resto da vida, como “empregada doméstica” do meu tio José. Ela foi o braço direito da mamãe, aliás, o braço direito e o esquerdo, pois uma das mãos que passou a lidar com a canastra era a da Maria. Lembro-me muito das duas, uma de cada lado, levantando e carregando a canastra pelas plataformas das estações de trens de Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, São Paulo e Barra do Piraí, última escala antes de chegar a Belo Horizonte. E, no fim, a dita canastra ficou para a Maria, para guardar os seus pertences na casa do tio Zé. Nunca mais eu vi uma canastra nos lugarecs por onde andei.

Roberto Hermeto Brandão – advogado e professor aposentadoEmail: robertohbrandao@gmail.com

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