Decisão do STF responsabilizando os veículos é questionada

A recente decisão do STF que determina a responsabilização dos veículos pela divulgação de entrevistas em que o entrevistado faz acusações falsas tem gerado polêmica e questionamentos.

Chamada por uns de censura, é defendida por outros, como o próprio ministro Alexandre Morais, sob a alegação de que a medida vem em socorro do bom jornalismo, no combate à desinformação.

O certo é que a mídia impressa, eletrônica ou digital, é agora responsável criminalmente por entrevistas com algum indício de informação errada ou falsa. O STF diz em sua decisão que essa responsabilização pode ocorrer quando havia indícios de falsidade nas acusações na época da entrevista, ou em que as acusações não foram checadas.

Dúvidas

Mas fica a questão: o que são “informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas e mentirosas”, como diz o texto? Quem vai definir tudo isso quando se está fazendo uma entrevista ao vivo?

Na defesa da decisão, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do Supremo, afirma que a liberdade de imprensa deve ser consagrada com “responsabilidade” e que não é um direito absoluto. Para ele, embora não se admita censura prévia, é possível responsabilizar a publicação por “informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas”.

Acrescenta que a plena proteção constitucional à liberdade de imprensa “é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas”.

Ainda segundo o ministro, “na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se à época da divulgação “havia indícios concretos da falsidade da imputação; e o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.

Quais cuidados?

Especialistas observam afirmam que um dos pontos que demandarão maior esclarecimento é qual o cuidado que o veículo precisa ter, conforme citado pelo Supremo, e como serão tratadas circunstâncias como as entrevistas ao vivo.

Afinal, o que são “informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais”, segundo o STF?

O presidente da Associação Nacional de Jornais, Marcelo Rech, afirma há um avanço na discussão, mas existem lacunas que tornam a tese preocupante.

“Não está explicitado o que é dever de cuidado e o que pode ser considerado indício de falsidade. Isso deixa a imprensa e o jornalista inseguros. O que seriam indícios de falsidade? São interpretações subjetivas. Como ficam as entrevistas ao vivo? Isso não está claro. Deixa uma porta aberta para insegurança. Esperamos que no acordão de inteiro teor essas questões sejam dirimidas em benefício da liberdade de imprensa. Há uma porta aberta para a insegurança”, frisa.

Para o advogado Victor Lehaly, pesquisador do Pleb – Grupo de Pesquisa sobre Liberdade de Expressão no Brasil da PUC-Rio, a tese não vai resolver todos os casos justamente pela falta de definição precisa do que seria dever de cuidado e do que seriam “indícios concretos de falsidade”.

Na prática, diz Lehaly, não fica clara qual é a extensão da verificação dos fatos esperada da imprensa – se bastaria buscar ouvir o ofendido, por exemplo, ou se seria cobrada uma checagem mais minuciosa.

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