UM PARADOXO TECNOLÓGICO
Claro, a ciência não para nem pode parar. Mas, força de circunstâncias, às vezes, sobrepõe ou interpõe situações curiosas e indissolúveis causadas por um único instrumento: o aparelho celular.
Se houvesse a possibilidade de se fotografar a inteira humanidade, com uma super hiper lente grande-angular infinitesimal, obteríamos um instantâneo curioso e inédito a cada fração de sua exposição e com o mesmo resultado: milhões de pessoas falando ao celular, outras consultando, outras somente paradas em frente à tela, observando uma figura, conversando, assistindo filmes, jogando joguinhos, obtendo ajuda imediata, pedindo socorro, comprando coisas, passagens, ingressos para shows, teatros e por aí vai. Dentro de casa, dos ônibus, dos bondes, dos aviões, dos navios, dos botes, nas bikes, nos carros, a pé, correndo, nos elevadores enfim, todos flagrados com a máquina na mão e olhando pra ela. Não há um lugar do planeta onde, nesta exata fração milionésima de segundo, não seja constatada uma das situações relatadas.
Muitos vão dizer: “mas você está constatando e registrando o óbvio”. Eu sei, mas esta não é uma das funções dos cronistas, constatar e registrar o óbvio? E, sem viajar muito porque ficaria cansativo, constatar o óbvio também apresenta o paradoxo acima referido: todos estão infinitamente ligados e infinitamente distantes uns dos outros, com essa fabulosa máquina nas mãos.
Os cumprimentos e as despedidas são automáticos e instantâneos, sem qualquer afinidade, amor ou respeito. Cumprem exclusivamente uma formalidade e mesmo assim por indivíduos que ainda os mantêm em seus hábitos. Ficou tudo achatado, como se dizia das fotos sem volume, sem altos e baixos. Será que o mundo ficou também achatado? Perdeu a esfericidade? Sem brincadeiras nem deboche, estamos vivendo numa sociedade achatada pelo celular. Pensem nisto, por favor!
Roberto Hermeto Brandão – advogado e professor aposentado
Email: robertohbrandao@gmail.com