Martin Scorsese quer salvar o cinema das franquias e filmes de gibi
Sempre que Martin Scorsese está para lançar um novo filme, jornalistas perguntam ao diretor sobre o que ele acha do cinema atual — provavelmente sabendo da posição que a verdadeira lenda de Hollywood tem em relação a filmes baseados em quadrinhos. É uma opinião polêmica em tempos polarizados de internet, que rende audiência e movimenta os assuntos sobre cultura pop. Mas, ainda assim, bastante válida.
Em uma entrevista à revista GQ para divulgar seu novo filme Assassinos da Lua das Flores, Scorsese foi questionado sobre o cinema atual e fez declarações que balançaram fãs de histórias em quadrinhos, como esperado.
Um cinema sem risco
Em uma longa entrevista e perfil do diretor americano na revista, o trecho que gerou tanta polêmica é relativamente curto, mas incisivo em relação ao que Hollywood se tornou nos tempos atuais.
Falando sobre a forma de distribuição de filmes e como eles são produzidos em Hollywood, Scorsese comenta como é um problema se tudo o que é mostrado nos cinemas são adaptações de quadrinhos e franquias. Isso é uma resposta aos multiplexes, com várias salas do mesmo filme, que deixam outras produções sem uma tela para serem exibidas.
Quando um grande blockbuster, como os filmes da Marvel ou Star Wars, chega aos cinemas, é comum encontrar, tanto nos EUA quanto no Brasil, cinemas em que praticamente todas as salas são dominadas por apenas um filme. Isso é um problema para Scorsese.
“O perigo é o que isso está fazendo com a nossa cultura. Porque estão se formando gerações que vão pensar que o cinema é somente esse tipo de filme. Eu acredito que eles já pensam assim”, disse o diretor. E ele não está errado.
Um cinema sem variedade é um cinema sem graça
Dar qualquer opinião na internet nos dias de hoje é uma tarefa muito fácil e, ao mesmo tempo, muito difícil, pois não precisa de muito esforço para que a ideia que você queria passar seja completamente distorcida em menos de 24 horas.
O que Martin Scorsese disse à revista GQ é relativamente claro em relação à avalanche de adaptações e sequências que são lançadas mensalmente por estúdios de Hollywood. É cada vez mais difícil encontrar histórias originais e intrigantes nos cinemas, já que eles estão dominados por esses blockbusters.
É comum ver como pessoas definem suas personalidades em cima desses filmes, principalmente de franquias como DC, Marvel e Star Wars, e ficando realmente ofendidas quando alguém fala que não gosta desse tipo de produção.
Não é necessário muito tempo no YouTube para encontrar canais questionando a qualidade de filmes como Taxi Driver e Os Bons Companheiros porque o seu diretor disse que não gostou do filme dos Vingadores.
No fundo, apesar de não gostar desses filmes, o que Scorsese está falando não é que essas produções precisam deixar de existir, mas sim que o cinema não pode se resumir apenas a eles.
Salvando o cinema, um filme de cada vez
Por causa dessa ideia, o diretor acredita que outros criadores devem lutar para “salvar o cinema”. Ele menciona os Irmãos Safdie, de Joias Brutas, e Christopher Nolan, que recentemente dirigiu Oppenheimer, como cineastas capazes de reinventar o que é o cinema para novas gerações.
“O cinema pode ser qualquer coisa. Não precisa ser só filmes sérios. Quanto Mais Quente Melhor, aquilo era cinema. O que eu acho é que ‘conteúdo manufaturado’ não é cinema”, disse o diretor. Esse tipo de conteúdo, criado por comitês, sem uma visão artística clara — o que acontece bastante em adaptações de quadrinhos e franquias, ainda que não em todas —, parece ser o problema para Scorsese.
“É quase como se o filme fosse feito por inteligência artificial. Não significa que eles não tenham diretores incríveis e a equipe de efeitos especiais não fez um trabalho lindo. Mas o que isso significa? O que esses filmes trazem para você? Além do consumo de algo que logo some da sua mente, do seu corpo? O que eles trazem para você?”
O que muitos não conseguem perceber nas entrevistas de Martin Scorsese é que ele entende muito bem sobre como Hollywood é um negócio como outro qualquer e precisa ganhar dinheiro. Só que o diretor deixa cada vez mais claro que acredita que isso parece estar canibalizando o que o cinema representa como arte.
A partir do momento em que começarmos a pensar mais nisso, e não em como uma nova sequência de um filme de gibi faturou bilhões nas bilheterias, talvez conseguiremos a pensar mais como Scorsese. Considerando o histórico da lenda, isso não é algo ruim.
*Com informações de Canal Tech