Por que algumas pessoas gostam de coisas nojentas e aversivas?

Em outubro, mês do Halloween, fica mais óbvio que algumas pessoas adoram coisas nojentas: de filmes de horror cheios de sangue e tripas a aventuras dermatológicas de dar arrepios, há um mercado para todo tipo de repugnância e aversão presente no mundo. Mas se coisas nojentas são programadas para nos fazer, instintivamente, se afastar, por que nos atraímos por elas, às vezes?

Esse gosto pelo nojento, aliás, não é de hoje. Atualmente, temos programas de TV onde pessoas têm de comer coisas de aparência e origem apavorantes, perfis da internet que postam todo tipo de remoção de espinhas, cistos e afins, comédias cheias de vômito e urina e coisas do gênero. Desde os tempos de Shakespeare, no entanto, existe uma cultura ao aversivo.

Um pouco da história do nojo

A peça mais horrorosa de Shakespeare, nesse sentido, é Titus Andronicus, ou Tito Andrônico, que não fica atrás de qualquer filme da franquia Sexta-Feira 13. Nela, figuram 14 mortes, 9 delas no palco, com 6 desmembramentos, de 1 a 3 estupros, 1 caso de insanidade, 1 de canibalismo e 1 enterro vivo. Em média, são 5,2 cenas horrorosas por ato, ou uma a cada 97 falas. Críticos chegaram a questionar o motivo de qualquer audiência se entreter com uma repetição de violência tão marcada.

A sociedade da época, no entanto, não era tão estranha à violência: execuções públicas eram comuns, havia exibições de anatomia onde curiosos podiam observar autópsias e apotecários — curandeiros daquele tempo — deixavam membros humanos à mostra em seus escritórios antes de os misturar às suas poções, o que chamamos hoje de “canibalismo medicinal”.

O que diz a ciência

A questão é o nojo ser uma emoção de aversão — ou seja, que nos afasta, nos faz evitar. É o sinal de que algo poderá causar dano ao corpo, então é melhor ficar longe daquilo. Charles Darwin já observava que qualquer alimento que apresentasse uma aparência, odor ou natureza diferente já causava, rapidamente, sentimentos de nojo. Os cientistas, no geral, acreditam que a emoção tenha se originado como reação à comida podre.

Partindo desse ponto, o nojo foi lentamente evoluindo para cobrir outras coisas que podem nos passar patógenos perigosos, como doenças, alguns animais, machucados, cadáveres ou sexo. Indo além, a repugnância começou a abarcar coisas simbolicamente ameaçadoras, como violações morais, regras culturais e valores de grupo. Quando alguém diz que se sente enojado por atos racistas, por exemplo, a reação é exatamente essa.

De acordo com a psicologia, o estímulo de nojo, além de ter o objetivo de nos afastar, também prende a nossa atenção com mais força do que qualquer outro. De uma perspectiva evolucionária, ter chamado a nossa atenção ajudou o nojo a equipar nosso organismo com as ferramentas necessárias para evitar coisas perigosas. Aversão é ruim de se sentir, de fato, mas ela também captura nossa atenção muitíssimo bem.

Gostar de coisas nojentas é o que se chama de masoquismo benigno: uma forma de aproveitar experiências de risco controlado, como comer alimentos muito apimentados ou ir a uma montanha-russa. Quando perdemos a crença de que o objeto que nos enoja vai realmente nos fazer mal, a emoção psicológica de atenção torna aquilo excitante e interessante, o que vale para todo sentimento negativo.

Somos predispostos a nos atrair pelo nojento, então, nas circunstâncias certas, conseguimos aproveitá-lo. Quem viveu nos tempos de Shakespeare já dizia sentir um estranho prazer ao assistir a Tito Andrônico ou observar os cadáveres expostos na rua, mesmo sabendo que eram coisas repulsivas, da mesma forma que curtimos filmes de terror ou canais de dermatologia atualmente. Agradeça ao seu cérebro.

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